É saudável preocupar-se com o físico – e os adolescentes estão levando isso a sério. Nunca antes as academias de ginástica foram freqüentadas por gente tão jovem. Do total de alunos de grandes academias, como Runner, Fórmula Academia e Bio Ritmo, 25% têm menos de 20 anos. "A garotada começa a procurar a musculação a partir dos 13 anos, porque seus exercícios trazem resultados estéticos muito rápidos", diz Manoel Carrano, diretor-presidente da Fórmula Academia. Isso é bom e ruim. O jovem pode praticar todas as modalidades esportivas sem prejuízo à saúde ou ao processo de crescimento. Mas isso deve ser feito com moderação. Ou seja, é preciso limitar o tempo da prática esportiva e o esforço exigido. "A quantidade ideal até os 18 anos é seis horas por semana", diz Ana Lúcia de Sá Pinto, médica do esporte e pediatra do Ambulatório de Medicina Esportiva do Hospital das Clínicas, em São Paulo. O que requer mais cuidado e precaução é a sobrecarga de esforços. Vale a regra geral de que o jovem pode suportar 60% da carga de um adulto.
Os esportes dividem-se em quatro categorias, cada uma delas com diferente grau de cuidados para o adolescente:
• Anaeróbios: são os exercícios em que o praticante corre e pára várias vezes. Exemplos: futebol, basquete, vôlei, tênis e handebol. Uma partida de futebol entre adolescentes não deveria ultrapassar os 60 minutos, contra os 90 do jogo oficial. É evidente que os jovens não levam isso em conta e jogam durante horas, se puderem. Mas é o que diz o manual médico. Em tese, os excessos praticados nesses jogos não têm conseqüências drásticas.
• Aeróbios: são as modalidades que trabalham os músculos usando a respiração na produção de energia. Exemplos: corrida, ciclismo, natação, dança e ginástica aeróbica. Não há problema algum em correr e andar de bicicleta livremente, mas para competições a idade mínima recomendada é 14 (ciclismo) e 16 anos (corrida).
• Exercícios de resistência: são os que trabalham principalmente a força muscular. Entram nessa categoria a musculação e a ginástica olímpica. A musculação já foi inteiramente proibida para jovens na idade do crescimento. Hoje é permitida para maiores de 15 anos, mas com a restrição de peso. O excesso de carga pode levar ao endurecimento das articulações e, dessa forma, causar a interrupção precoce do processo de crescimento.
• Exercícios de resistência de alto risco: o objetivo é trabalhar a força dos músculos de forma intensa para ganhar massa muscular. Exemplos: o fisiculturismo, o levantamento de peso e o boxe. São contra-indicados para adolescentes. "O ideal é esperar o fim da fase de crescimento para começar a se preocupar com o ganho de massa muscular", diz o ortopedista Francisco Vanor Cruz, especialista em medicina do esporte do Hospital Uniclinic, em Fortaleza. "Antes disso, o garoto não tem corpo de homem e os ossos não estão consolidados."
Basta observar o movimento nas ruas das principais cidades brasileiras, no início das manhãs e nos fins de tarde, para constatar: correr está na moda. Cada vez mais gente descobre os prazeres – e as vantagens – da corrida como forma de condicionamento físico. Calcula-se que, hoje, 4 milhões de brasileiros corram regularmente. É uma febre que pode ser medida pela quantidade de esportistas que participam de provas e competições. Em São Paulo, o número de inscritos nas diversas provas realizadas pela ONG Corpore, a maior organizadora de eventos desse tipo na América Latina, passou de 9 400 pessoas em 1997 para mais de 56 000 em 2004. A Meia Maratona do Rio de Janeiro, que em 1997 contou com 3 300 competidores, neste ano teve recorde de 13 400 corredores inscritos. Na São Silvestre, a competição mais famosa do país, realizada todo dia 31 de dezembro em São Paulo, o número de participantes passou de 7 700 em 1996 para mais de 15 000 em 2003 – chegando ao limite de inscrições que o regulamento permite. A febre da corrida se evidencia também pela multiplicação das assessorias esportivas, organizações formadas por treinadores e professores de educação física que planejam e orientam os treinos de quem quer ampliar os próprios limites na corrida. Em São Paulo já existem 120 empresas desse tipo.
Segundo os médicos, a corrida é um dos melhores exercícios que existem. Estudos recentes concluíram que sua prática regular proporciona os seguintes benefícios à saúde:
• Reduz o risco de doenças cardiovasculares, ajuda a pressão arterial a manter-se em níveis satisfatórios e aumenta as taxas de HDL (o bom colesterol).
• Diminui o risco de desenvolver diabetes. Faz com que a ação da insulina se torne mais eficiente, reduzindo a taxa de açúcar no sangue.
• Melhora o funcionamento do cérebro e o humor. Durante a corrida, o cérebro aumenta a produção de serotonina, dopamina e endorfina, substâncias que proporcionam sensação de bem-estar.
• Fortalece os ossos e as articulações. Faz com que a densidade dos ossos aumente durante a juventude e desacelera a perda de massa óssea na fase adulta.
• Ajuda a emagrecer e a manter o peso. O organismo queima uma grande quantidade de gordura para produzir energia. Em uma hora de corrida rápida, eliminam-se 800 calorias, mesma quantidade fornecida por um hambúrguer e uma porção de batatas fritas.
Mesmo quem costuma caminhar pode incluir um pouco de corrida no meio do exercício. Bastam dois minutos de corrida para aumentar a combustão de calorias e melhorar o condicionamento físico
Até alguns anos atrás, o adolescente praticava esporte na rua, na escola, no clube ou na área de lazer do condomínio. Cada vez mais, no entanto, o público dessa faixa etária vem se deixando seduzir pelas academias. Na vida de muitos meninos e meninas, freqüentar esses lugares virou atividade corriqueira. Academias já oferecem, inclusive, programas específicos para eles. Os especialistas julgam que esse cultivo do corpo é positivo, porque se trata de um contraponto a práticas como a alimentação à base de fast food e o hábito de gastar horas diante do computador. Mas os jovens devem ficar atentos aos riscos a que estão expostos. Como seu corpo e sua identidade estão em formação, o adolescente é naturalmente inseguro com a aparência. E a comparação com os físicos malhados ao redor – em geral de adultos que já completaram o desenvolvimento do corpo – pode aumentar suas angústias. Os garotos querem ficar tão musculosos quanto os veteranos do local. As garotas almejam ter a silhueta esbelta das mulheres. Quando viram obsessão, esses desejos prejudicam a saúde, causam transtornos psíquicos e até levam ao caminho das drogas
Os jovens estão freqüentando a academia cada vez mais cedo. No caso dos garotos, o chamariz é a musculação. Embora se recomende que esse público dê preferência a esportes como o vôlei e a natação, o exercício de levantar pesos pode ter efeito benéfico, se bem orientado. O estudante paulistano Octacílio Costa Neto, de 12 anos, é um exemplo. Ele pratica musculação há cinco meses, sob a supervisão de um professor, para corrigir sua postura. "Já sinto a diferença", diz Neto. Mas a musculação na adolescência deve ser vista com cautela. Quando observam os mais crescidos pegarem pesado nos halteres, muitos tendem a imitá-los – e isso pode ter conseqüências graves. A prática precoce pode prejudicar o crescimento do adolescente. "Há riscos de lesões e de atrofia dos músculos", diz o professor de educação física Mauro Celio do Carmo, da academia paulistana Fórmula.
Ao freqüentarem esses ambientes de culto ao físico, os adolescentes têm de tomar cuidado para não entrar numa espiral de neuroses. Os garotos que praticam musculação são suscetíveis a um transtorno psíquico conhecido como vigorexia. Apesar de musculoso, o rapaz se olha no espelho e acha que está flácido. Isso leva ao ganho exagerado de massa muscular e à tentação dos anabolizantes. O contrário disso – a obsessão de perder peso – não é um perigo menor. Uma pesquisa do Instituto Central do Hospital das Clínicas de São Paulo mostrou que, num universo de 588 jovens de 11 a 18 anos, 47% tinham feito dieta mais de oito vezes. "Quase 5% deles recorreram a métodos nada ortodoxos para perder peso, como o uso de laxantes e diuréticos e o vômito auto-induzido", diz a psicanalista Mara Cristina de Lucia, que coordenou o estudo. As meninas são as maiores vítimas da obsessão pela magreza. No caso das garotas que freqüentam academia, gastar mais tempo que o recomendável na esteira pode ser um indício de que a preocupação passou dos limites. Num extremo – e aí já se trata de distúrbios que requerem apoio de terapia –, a fixação pode levar a males como a anoxeria e a bulimia. Não custa lembrar: preocupar-se com o corpo faz bem, mas é melhor pegar leve.
Mesmo depois de tudo o que foi dito e escrito sobre as maravilhas que a atividade física pode proporcionar, ainda falta ânimo para começar a malhar? Aí vai uma sugestão: encare a prática regular de exercícios físicos como quem poupa dinheiro para uma aposentadoria tranqüila. Pessoas que se exercitam vivem mais e melhor. Depois de acompanharem durante 25 anos 17 000 estudantes recém-saídos da faculdade, pesquisadores da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, chegaram a uma conta tão simples quanto dois mais dois. Cada hora dedicada à atividade física rende duas horas a mais de vida. O sedentarismo está relacionado a 37% das mortes por câncer, a 54% dos óbitos por doenças cardiovasculares e a 50% dos derrames fatais. Vale a pena levantar-se do sofá, espantar a preguiça e começar a se mexer, não vale?
A importância da atividade física para a saúde começou a ser esmiuçada no fim da década de 60, pelo médico americano Kenneth Cooper. No livro Aerobics, de 1968, ele lançou a teoria de que a chave para manter o organismo em bom estado, especialmente o coração e os pulmões, eram os exercícios aeróbicos. Com o lema de que "mais é melhor", o doutor Cooper preconizava uma rotina de atividade física que se iniciava com corridas de 1,6 quilômetro em doze minutos, cinco vezes por semana. Progressivamente, o ritmo deveria aumentar até alcançar a marca dos 2,8 quilômetros, percorridos nos mesmos doze minutos. Era, sem dúvida, um exagero. Com as descobertas proporcionadas pela fisiologia do esporte, muita coisa mudou de lá para cá. Percebeu-se que o excesso de atividade física pode fazer muito mal à saúde. Os danos mais comuns são as lesões musculares, articulares e nos tendões. O próprio Cooper reviu seus conceitos e tornou-se um arauto da ginástica com moderação. As desabaladas carreiras foram substituídas por caminhadas diárias de 3 quilômetros em meia hora. Com essa rotina, é possível reduzir em até 40% a incidência de várias doenças crônicas. Cai o risco de infarto, derrame, diabetes, osteoporose, artrite e até depressão.
Até pouco tempo atrás, acreditava-se que a musculação não tinha importância nenhuma para a manutenção de uma boa saúde. Servia apenas para tornear formas. Esse equívoco foi desfeito. Estudos recentes mostram que puxar ferro é tão benéfico quanto caminhar ou nadar – desde que, é claro, com a devida orientação de instrutores especializados. Trabalhar os músculos das pernas, por exemplo, faz bem ao coração. Com as pernas fortalecidas, o retorno do sangue ao coração é mais eficiente. A musculação também protege os ossos e as articulações. A contração muscular estimula as células produtoras de ossos a trabalhar com mais vigor e intensifica a fixação de cálcio no esqueleto, o que ajuda a prevenir a osteoporose, doença em que há uma perda progressiva de massa óssea. O aumento de músculos diminui o atrito entre as articulações, o que baixa o risco de artrose. Como são os músculos que sustentam o esqueleto, quando estão enrijecidos eles mantêm a postura certa. Não é à toa que os exercícios de musculação são indicados para muitos casos de dores nas costas. A musculação intensifica ainda a eliminação de glicose pelo organismo. O excesso de glicose no sangue é o que caracteriza o diabetes. Tem mais. Quem imagina que musculação não emagrece está redondamente enganado. Uma pesquisa americana mostra que, duas horas depois do término de um treinamento com peso, o organismo continua a queimar calorias.
O que se recomenda atualmente, em nome da boa saúde, é uma rotina de exercícios físicos que agregue atividades aeróbicas, musculação e alongamento. Essa é a forma mais indicada de melhorar e manter o fôlego, a força, a flexibilidade e a coordenação motora. À medida que o tempo passa, a importância disso tudo vai saltando mais e mais aos olhos. São essas características que permitem que uma pessoa de idade conserve a sua independência na execução de atividades corriqueiras. O jovem malhador de hoje, enfim, é o senhor sacudido de amanhã.